Mundo Financeiro

A taxa do cheque especial caiu! Tá feliz por quê?

Ouviu dizer que a taxa do cheque especial caiu?

Será que essa queda é motivo para comemorar?

Recebi, há alguns dias, um e-mail do banco em que tenho conta. Não costumo abrir esse tipo de e-mail, mas a expressão “cheque especial” no título me fez clicar.

A mensagem comemorava o fato de a taxa de juros do meu cheque especial ter caído para 8% ao mês. Comemorava mesmo, com direito até a ponto de exclamação!

Além disso, outra razão para comemorar, segundo o e-mail, é o fato de que, embora o governo já tenha decidido que as instituições poderão cobrar tarifa para limites acima de R$ 500,00, meu banco decidiu abrir mão dessa cobrança para me beneficiar. É muita bondade, não é mesmo?!

taxa do cheque especial caiu

Fala sério, né…

Vamos lá! Primeiro, o banco faz parecer (pelo menos eu achei) que essa redução do juro do cheque especial para 8% ao mês foi uma benesse do magnânimo coração de seu presidente. Mas, se você lê pelo menos um pouco sobre economia, sabe que os bancos, na verdade, foram obrigados a isso pelo Banco Central.

Sim, em novembro do ano passado, a autoridade monetária revisou as regras do cheque especial e determinou que o teto para cobrança de juros dessa modalidade de crédito passaria a ser de 8% ao mês. A obrigação começou a valer no dia 6 de janeiro de 2020.

Segundo, não vejo razão para exclamações. Uma taxa de juros de 8% ao mês equivale a 151,8% ao ano.

Sabe o que isso significa?

Vamos imaginar uma pequena tragédia financeira: digamos que eu errei a mão nos gastos em determinado mês e estourei o limite do cheque especial em R$ 1.000,00. Imagino que isso nuuuuunca, nunca, nunquinha aconteceria com tão seleto público leitor. Mas façamos um tremendo esforço de imaginação. Vou me sacrificar pelo bem da didática.

Ao fim de um mês, com a incidência dessa taxa, a dívida passaria a ser de R$ 1.080,00. Para cobrir essa dívida, vejo 3 soluções possíveis.

1. Ganhar R$ 1.080,00 a mais no mês.

Não sei para você, mas para mim é difícil arrumar um extra dessa magnitude.

2. Cortar R$ 1.080,00 no meu consumo mensal.

Também é difícil. Embora eu nem sempre vença nesse jogo da vida, os meus boletos sempre vencem.

3. Trocar a dívida mais cara por uma mais barata.

Essa é a saída mais inteligente. Mas, novamente, por amor à didática, imaginemos que eu não saiba dessa possibilidade. Já você que me lê, se passa por isso, vá atrás dessa troca de dívida o quanto antes.

Seguindo, imaginemos que eu não consegui nem ganhar mais, nem reduzir meu consumo, nem trocar a dívida. Tudo isso por 12 meses.

No fim de um ano, minha dívida terá aumentado para R$ 2.518,17. Isso considerando que eu não tenha feito mais nenhuma bobagem, aumentando o valor usado do cheque especial. (Acham impossível? Vocês tão precisando conversar com mais gente na rua.)

Está feita a minha “cova” financeira.

Daí para uma espiral descendente é um passo.

A dívida vai aumentar exponencialmente e todos os problemas decorrentes disso (inclusive os de saúde) também.

Você pode estar se perguntando: tá, mas e aí?

Não tem por que comemorar queda de limite de cheque especial!

Sabe por quê? Essa modalidade de crédito não deveria nem existir, quanto mais estar entre as possibilidades consideradas por alguém.

“Ah, mas os imprevistos da vida acontecem”.

Verdade!

É por isso que a gente sempre bate na tecla do “colchão” de emergência.

Mas o que é essa tal de “colchão” de emergência?

Nada mais é que um valor equivalente a algo entre 6 e 12 meses dos seus gastos mensais investidos em uma aplicação com liquidez diária.

Pode ser um fundo DI, por exemplo, ou até a poupança (que é bem perto de nada, mas é melhor que nada. Prefira o fundo DI).

Essa reserva é justamente para dar segurança financeira frente aos imprevistos da vida.

Ah, mas eu tenho direito a me dar uns mimos por mês, minha vida é difícil.

Verdade, a minha também. Mas, às vezes, eu acho que a gente se comporta como aquelas crianças que esperneiam no shopping porque querem um brinquedo, e não param até o pai comprar. Com a diferença que, no caso das crianças, o efeito colateral é vergonha pública (dos pais).

No nosso caso, colocamos nossa saúde financeira em risco simplesmente porque não admitimos esperar por algo de que achamos que precisamos. Na maioria das vezes, poderíamos passar sem com tranquilidade.

Cheque especial é um produto que aparece como reação (bem inteligente, aliás) dos bancos para lucrar com o fato de que somos mimados, imediatistas e não nos planejamos.

A dor de entrar em um abismo financeiro sempre será infinitamente maior do que o incomodo de adiar algum consumo ou de criar hábitos de poupança e planejamento. Não vale a pena entrar nessa, nem com a taxa caindo para 8% ao mês.

Por isso eu digo: não há razão para exclamação! Dá vontade de responder o e-mail com um: “tá feliz por quê?”.

 

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Eduardo Tavares: Especialista em Finanças Corporativas e Investment Banking pela FIA Business School e sócio-fundador do Mundo Financeiro. Além disso, professor de Finanças para cursos de Pós-graduação e MBA na FIA Business School.

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